Total de visitas ao Blog de Luar do Conselheiro:

Cordel: ABC da Boca do Rio



A obra: Nesta obra o autor retrata a comunidade onde cresceu, onde fez amigos e construiu histórias. Num passeio literário em sua comunidade conhecemos os personagens, as personalidades, a história e as lutas.


Vou falar da minha aldeia
Para ser universal
Falar da comunidade
Que é reduto cultural
Peço a vossa atenção
Vou falar de coração
De onde sou natural

Esta tal comunidade
Chamada Boca do Rio
Litoral de Salvador
Na Bahia, no Brasil.
Fez-se palco da história
Da cultura e da memória
E os artistas reuniu

Tem a Praia dos Artistas
Reduto da Tropicália
Aloísio, Del, Verinha,
Com as cabanas de palha
Tartarugas e golfinhos
Já fizeram dali ninho
Hoje estão matando a praia

Quem já não ouviu falar
Lá do bar do Pimentinha
Na segunda-feira abre
Faça chuva ou ventania
Cabra que é bom bebedor
Bebe pinga ou licor
Sem jamais perder a linha

A nossa comunidade
Tem tradição em barzinho
Bar de Roque, dos Coroas
E o nosso bar de Santinho
Nestes bares a cultura
Cerveja e literatura
Andam no mesmo caminho

Poucos sabem da história
Do Alto do São Francisco
Pois lá era cemitério
Dos povos mais primitivos
A nação Tupinambá
Escolheu este lugar
Pra abrigar seus entes idos

E o nosso Rio das Pedras
Dá tristeza de contar
Onde abundava antes
O peixe Tamboatá
Que nas secas das lagoas
Andava horas boas
Pra este rio encontrar

Lá na beira deste rio
Onde se pega guaiamum
Há um bom tempo atrás
Também se pegava pitu
Mas é grande a malvadeza
Hoje choro com tristeza
A morte do Pituaçu

As restingas que havia
Na nossa Boca do Rio
Tinha Cabeça de Frade
Gavião sempre existiu
Fruta de mandacaru
Alimento de anú
O Passarim de lá sumiu

O Parque do Pituaçu
Não está delimitado
Por isso que dia e noite
Vem sendo assassinado
A CONDER é a culpada
Salvador tá condenada
Seu pulmão será roubado

Vem agora a EMBASA
E o governo do Estado
Com um tal de Emissário
Pro problema ser sanado
Esgoto sem tratamento
Espalhado num lamento
Em nossa Praia do Corsário

Apesar desta grandeza
De luta e de cultura
Nosso canto sofre ainda
Resquícios de ditadura
Os pescadores da Colônia
Sem vergonha ou cerimônia
Jogados á sorte dura

Até de um Terno de Reis
A comunidade goza
Com o Mestre Zé Gaguinho
Grupo Semente da Roça
Ladainha e Cantoria
Farreando noite e dia
Que é disso que o povo gosta!

Se falar religião
Boca do Rio é singular
A AMORC Rosa-cruz
No Georgina é popular
Igreja de São Francisco
Mórmon e Espiritismo
Só falta Cristo Voltar

Terreiros de Candomblé
Todos sabem onde fica
Zen Budismo, Maranata,
Umbanda, Cabala e Wicca.
Na nossa comuna irmã
Só não tem o Taliban
Por que Alah não deu a dica

Selma do Acarajé
Frente ao seu tabuleiro
Nós temos a Quinta do Samba
Na Baixa do Cajueiro
Berimbau de Caboré
Aloísio andando a pé
Babalu velho guerreiro

Tem também um caso sério
Mistério de nossa praia
Dizem que é um buraco
Que puxa quem se distraia
Quem nadar ali por cima
Garanto não faz mais rima
Vai morrer na Aratubaia

Poucos já puderam ver
As indígenas canoas
Nossa história primitiva
Tá apodrecendo à toa
Se for passear no parque
De Pituaçu de tarde
Conhecer é uma boa

Tem a puxada de rede
Quase todas as manhãs
E agora tem a feira
Para nossas artesãs
Artesanato nota mil
Só aqui na Boca do Rio
É renda pras tecelãs

Temos o Forró Lelê
Que é grupo de quadrilha
Tem fanfarra no IMEJA
Tem grupo de poesia
Biblioteca Prometeu
Com poeta amigo meu
E encontro de cantoria

Nós temos entalhadores
Escultores, artesãos
Toda arte é família
Nela são todos irmão
Seja barro ou areia
Seja tela ou madeira
Criam arte com as mãos

Estão sufocando a feira
Tradição desta comuna
Já mudaram de lugar
Varias vezes, não só uma
Quero ver quem vai brigar
Pois eu sei não vai tardar
Pra que nossa feira suma

Nós temos a Casa Koolping
Muito mais do que escola
A paróquia tem certeza
Que cultura não é esmola
Tem aula de violão
Idioma, digitação
e capoeira Angola

O Mestre Boca do Rio
Angoleiro de valor
A Capoeira Brasil
Regional pra entendedor
Tem Capoeira Palmares
Capoeira qualidade
Alunos de Mestre Nô

O Colégio Montessoriano
Agora já tem Faculdade
Essa é mais uma conquista
Da nossa comunidade
Só falta o ensino superior
Ser gratuito de verdade

Não podia esquecer
De falar de quem vos fala
Cresci na Boca do Rio
Onde Quem cresce não cala
Vou tentar falar de mim
Sem começo meio ou fim
Sempre evitando pala

Cordelista e Cantador
Poeta e Cangaceiro
Comunista e Trovador
Por opção Catingueiro
Eu sou a mosca na sopa
Quero ver quem cala a boca
Do Luar do Conselheiro