Ouçam minha música
Ouçam minha música... E não esperem de mim sofrejos;
não esperem de mim andrajos... Ou desculpas ou pudor.
Ouçam minha música e não esperem atitudes que não sejam minhas;
não esperem de mim modelo, não esperem de mim mentiras.
Ouçam minha música... E não esperem ou cobre de mim a música;
não esperem de mim o verso ou o inverso.
Leiam meus escritos... E não esperem de mim os ditos, nem os mitos;
não esperem de mim favores... Não esperem de mim rancores, pois não os tenho.
Não esperem de mim desdém, ou ênfase.
Ouçam minha música, leiam meus escritos...
Não esperem o que não sou; não quebrem ou cobrem, não invertam nem submetam;
não ponham palavras nos meus escritos, nem frases em minha música.
Apenas ouçam minha música, leiam meus escritos;
aproveitem o que digo e enquanto eu digo; se divirtam com meus erros e acertos...
Mas não espere de mim padrão! Não esperem hegemonia!
Não me culpem ou cacem!
Ouçam minha música, leiam meus escritos, é lá que sou e estou...
Não me submeto nem me sub-omito...
Leiam minha música... Ouçam meus escritos.
Cabe pois ao poeta
(Á Gregório de Mattos)
Cabe, pois ao poeta, a resignação!
Bem aventurado o que nega o ópio,
Ainda que sua presença seja uma constante!
Ah! Discípulos de Lorde Byron!
Transeuntes da polêmica!
Incestuosos avatares da divina arte!
Sabeis que vossos versos são ouvidos!
Mártires da vanguarda!
Masturbando a digníssima decência com estrofes libertinas de desapego!
Circundo as esferas da luxúria calmo e imponente!
Lanço versos ao espaço crendo, pois que sou qual Deus!
Navegando na eternidade de minha individualidade!
E a majestosa nobreza? Coitada!
Tão desamparada frente a esses depravados sacerdotes da palavra!
A eles causa repugnância nossos cortejos eternos!
Nossos cósmicos adultérios e nossa sede de desejos!
Dai-nos absinto! Ayahuasca!
Encha-nos com o vinho orgásmico da pisilocibina!
Pois somos nós os descendentes dos Deuses e Deusas dos nossos ancestrais!
Mas hoje?! Frente ao caos, antes por nós profetizado...
Cabe tão somente ao poeta a resignação.
À Bram Stocker
Quão maravilhoso me parece ser amado pela morte!
Vagar pela noite sem fitar a luz do dia, bebendo sem agonia o sangue puro das consortes!
Tendo ainda a magia da beleza imortal! Sendo um ser transcendental que ao tempo desafia!
Quão maravilhosos me parecem estes olhos que não perecem! De um vermelho tão profundo, sendo ainda um ser imundo e se escondendo num caixão?!
Cruzes mal algum lhe fazem! Isso tudo é bobagem de um irlandês demente! Até diria indecente como o toque da tua mão.
Vampiro é teu nome! Quente como a chama que consome a vela no altar; fazendo-me até chorar de ódio, amor ou medo; por conter este segredo da tua simples existência; que o homem por tendência teima em não acreditar.
Hoje em dia desconfio se te amo ou desafio, se te odeio ou te ignoro ou se apenas eu imploro que a tua existência não passe só de lenda nem de fruto do ilusório...
Pois me digam meus amigos... Como é que eu me inspiro... Sem a história de um Vampiro?!
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Jurema
Eu fui buscar no mato, a casca da jurema pro pajé fazer o chá.
Pedi água pra Iara, pedi folhas pra Jarina, pedi asas pra Jandaia, mergulhei com Janaína...
Acendi fumo de corda com semente de Umburana, eu dancei com Pachamama velha dança no Toré. Perimbó e Deus Tupã, pensamentos delirantes, a Jandira e o Massato fazem parte do pajé...
Sou Tapuia, sou Xavante, sou guerreiro Yanomami, Tupinambá ou Cariri, sou Pataxó ou Guarani!
Sou do povo Caiapó, eu sou índio Tapajó, com jenipapo e urucum no meio do Ouricuri...
Eu fui buscar no mato o cipó do Mariri, nas terras de Muyrakitan encontrei a luz de Yaci.
Na cabaça botei água dancei a dança da águia fui na busca da visão e avistei a Juriti...
O passarinho me falou que o pajé já terminou, a Jurema foi fervida e o chá cura ferida e também mostra o interior... Sou Ocá, sou Funi-ô, curandeiro e caçador... Meu colar de pena branca...
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Reticências
O caminho é tortuoso, embora siga intocável.
Divido o caminho com outrem, embora por pouco tempo.
O indelével é procaz no meu íntimo, e tento em vão apagar.
Sussurros beijam meus ouvidos, imagens projetam-se em tela...
Ponto Ponto Ponto... Adoro reticências.
E o que elas escondem? O que ocultam os três pontos?
Será a chave? Ou à Shiva, a altiva Deméter de outrora?!
Poupe o pensamento! Não sejas em vão. Antes, porém coma o pão, beba do vinho...
Ponto Ponto Ponto.
Há flores e frutos nos cactos; e hifas nos fungos...
Se há outros mundos, lá também tem hifas...
Elas são eternas! Micélicas; locomovem-se ponto á ponto...
As hifas são reticências; nem sempre retilíneas às vezes espiraladas...
... Costumava comer reticências azuladas, me recordo.
Reticências podem ser Amanitas e mantidas em mel, podem ter haste lisa ou com anel.
De repente apago do meu íntimo o procaz indelével... E reflito profundamente as consciências...
Então termino meu poema com reticências...
...
Nas Derribas de Cerca
(Á BGG da Mata Virgem, Panchinha e outros guerreiros de Uauá)
Ao som dos tambores de couro de cabra e da voz do repentista, os sertanejos de alicate, facão e foice derrubam as cercas criminosas.
De repente surgem no meio da caatinga cercada, homens com mais arma que a polícia!
O Cabra velho cai pra dentro dos homens, disposto a matar e morrer pelo pedaço de chão.
Os cantadores versam as coisas lindas do nordeste, ajudando moralmente os catingueiros na ação... E eu digo vixe! Danou-se! Os homens fugiram do pau de sebo! Correram mesmo com medo do povo do meu sertão!
Nas derribadas de cerca é assim mesmo Cabra velho! Tem que ser na tora! No braço! Que nem os guerreiros e guerreiras de canudos que enfrentaram os canhonaços!
Somos mesmo matutos, catingueiros, assim como a farinha e a rapadura! Não sairemos do nosso quinhão, nem que chova pedra pura!
No combate na arma, ou no verso na bala, aquele que mangar de nós vai levar verso na cara!
Eu agora me vou embora, pois já tenho que me ir, mais antes quero falar, tu não bote cerca aqui! Se tiver um só moirão, eu faço revolução com os cabra tudo daqui!